Você sabe o que é a CIF?
De 7 a 10 de setembro realizou-se no Hotel Othon em Salvador o XXII Congresso Brasileiro de Genética Médica e Triagem Neonatal onde foram discutidas e apresentadas diversas síndromes e doenças, casos estudados, aspectos múltiplos da relação doença genética x profissional x família, qualidade de vida, a importância da triagem neonatal e novas abordagens sobre estes temas, dentre outros.
Em uma das palestras, discutiu-se a questão da qualidade de vida de indivíduos com doenças e/ou síndromes genéticas. O que mais foi ressaltado é a importância do médico geneticista, neuropediatras, terapeutas e todos os profissionais de alguma forma relacionados a Saúde, utilizarem não apenas a descrição constante na CID (Classificação Internacional de Doenças), mas integrar a CIF – CLASSIFICAÇÃO INTERNACIONAL DE FUNCIONALIDADES no diagnóstico e tratamento. A CIF é uma classificação internacional da OMS (Organização Mundial de Saúde), aceita pelo Brasil, porém ainda pouco utilizada.
Em geral, os médicos fazem o diagnóstico e trabalham baseados no conteúdo etiológico da CID; usando a Síndrome de Angelman como exemplo, o quadro descritivo da SA inclui várias incapacidades e deficiências, que geralmente nos deixam assustadas até desanimadas quanto a capacidade dos nossos Angelmans. O modelo da CIF substitui o enfoque negativo da deficiência e da incapacidade por uma perspectiva positiva, considerando as atividades que um indivíduo apresenta alteração de função e/ou da estrutura do corpo, pode desempenhar, assim como sua participação social.
A funcionalidade e a incapacidade dos indivíduos são determinadas pelo contexto ambiental onde a pessoa vive. A CIF representa uma mudança de paradigma para se pensar e trabalhar a deficiência e a incapacidade constituindo um instrumento importante para a avaliação das condições de vida e para a promoção de políticas de inclusão social. A classificação vem sendo incorporada e utilizada em diversos setores da saúde e equipes multidisciplinares, no entanto será mais adequada à medida que for utilizada por um número maior de profissionais em locais diversos a partir de pessoas e realidades diferentes.
A CIF agrupa sistematicamente diferentes áreas de domínio de uma pessoa com uma determinada condição de saúde (p.ex.: o que uma pessoa com uma doença ou síndrome faz ou pode fazer). A Funcionalidade é um termo que engloba todas as funções do corpo, atividades e participação; do mesmo modo, incapacidade é um termo que inclui deficiências, limitação de atividades ou restrição na participação.
A CIF também relaciona os fatores ambientais que interagem com todos estes panoramas. Neste sentido, a classificação permite registrar perfis úteis da funcionalidade, incapacidade e saúde dos indivíduos em várias áreas. A CID proporciona um “diagnóstico” de doenças, síndromes, transtornos ou outras condições de saúde, que é complementado pelas informações adicionais fornecidas pela CIF sobre funcionalidade.
Segundo a OMS (Organização Mundial de Saúde), a CID e a CIF são complementares. A informação sobre o diagnóstico acrescido da funcionalidade fornece um quadro mais amplo sobre a saúde do indivíduo. P.ex.: Duas pessoas com a mesma síndrome ou doença podem ter diferentes níveis de funcionalidade e duas pessoas com a mesma funcionalidade não necessariamente tem a mesma síndrome ou condição de saúde.
Na minha opinião, o que foi sugerido é que a classe médica, terapeutas e pesquisadores comecem efetivamente a incorporar o uso da CIF junto com a CID, pois nenhum indivíduo é igual ao outro, mesmo que ambos possuam a mesma doença/síndrome. Deve-se reconhecer, aproveitar e trabalhar as habilidades individuais do paciente e não descartar o potencial que ele poderá apresentar no futuro, justamente por conta das diferenças individuais.
ATIVIDADE e PARTICIPAÇÃO são palavras chaves e o conteúdo destes 2 componentes vão desde a organização de tarefas simples até atividades mais complexas da vida diária, com especial destaque ao aprendizado e aplicação do conhecimento; tarefas e demandas gerais; comunicação, mobilidade, cuidados pessoais, atividades e situações da vida doméstica, relações e interações interpessoais, educação, autonomia e independência dentro de suas limitações.
A mudança de foco do aspecto biológico da condição do paciente para uma abordagem mais psicossocial do indivíduo é um fator essencial para a melhora na qualidade de vida daqueles afetados por qualquer tipo de síndrome ou doença. E esta relação médico x paciente x família deve se guiar tanto pelos aspectos etiológicos da doença como pelos aspectos ambientais e psicossociais para garantir ou ao menos amenizar as dificuldades destes indivíduos.
Não podemos e nunca devemos comparar nossas crianças com aquelas sem síndrome ou doença genética. Não podemos nem mesmo comparar uma criança com SA com outra criança com SA. Alguns caminham super bem; outros têm muita dificuldade de caminhar; outras ainda não conseguiram caminhar (mas com muito trabalho e esforço, sei que conseguirão). Algumas crianças não falam nada; outras falam 2 ou 3 palavras; outras mais que isso. Algumas aceitam bem o uso de óculos, bonés, órteses, etc.; outros saem gritando e arrancando qualquer “acessório”. Apesar das enormes semelhanças entre eles, cada indivíduo é único, com suas capacidades e deficiências… o importante é estimulá-los ao máximo, pois eles têm um potencial que ninguém pode determinar.
Isso me faz lembrar da história do vôo do besouro. O besouro, pelos príncipios da física, não foi feito para voar. Seu corpo não é anatomicamente desenhado para voar. Suas asas são pequenas demais para sustentar o corpo que é muito pesado. Suas antenas são muito curtas para um bom sistema de “navegação e localização”. Mas há um porém: o besouro não sabe disso. Por isso ele voa.
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